sábado, 29 de março de 2008

de olhos vermelhos, e pêlo branquinho... eu sou um ratinho!


Existem certas coisas que não se pode deixar de partilhar, seja com quem for...comigo mesma, com os meus pensamentos, com as teclas em que carrego e que se submetem aos meus caprichos.

Hoje manipulei pela primeira vez ratinhos de laboratório... branquinhos, irrequietos, de olhos vermelhos, bigodes compridos e narizinho cor de rosa. Não foi surpresa, mas não foi fácil, e precisei de uns cadinhos de mentalização ;)

Avançar e pegar um deles pela cauda, deixando-o suspenso no ar foi o primeiro passo - e o mais difícil. A cauda de um ratinho é uma coisa estranha...dificil de agarrar com indiferença (pelo menos das primeiras vezes), especialmente quando o que está na outra ponta se torce e contorce, tentando escapar. Mas consegui.Uff.

Parte II - Imobilizar o bicharoco. Ui agora é que vai ser. "A fazer: sem largar a cauda do ratinho, prender (com alguma pressão) o dorso e avançar para junto da cabeça formando um prega de pele. É por esta prega de pele que se deve pegar (como as mães fazem com os filhotes). É suposto também puxa um nadinha de pele entre as orelhas, o que vai fazer com que o ratinho fique quieto." Palavras sensatas sr.professor-que-só-tem-mais-4-anos-que-eu, mas já estou a ver a minha vida a andar para trás...

Mas saí-me bem. Houve pranto e ranger de dentes...ou quase...houve dentes, e um dedo de um colega de grupo a sangrar, porque o ratinho lhe chamou um "bife com batatas fritas e um ovo a cavalo", mas nada de preocupante.

Faziam parte do plano das festas também: administrações intraperitoneais, intravenosas e subcutâneas (ou seja, injecçõezitas...) e administração oral (introdução de uma sondazita pela garganta). Confesso que me fiquei pela administração oral (era demais para um dia só...), e aliás até fui quem a conseguiu fazer melhor, mas espero solenemente que não tenha nascido para isto porque "isto" não faz muito o meu género.

Concluindo, foram 3h de verdadeiro circo, passadas entre com ratinhos irrequietos e alunos aos ginchinhos "ai que vai-me morder"..."fecha isso, vai fugir!!"..."ai que coisa horrível" e outros sons e expressões pouco dignificantes...(a expressão "gritar como uma menina" aplica-se a várias pessoas pelo que percebi...nem todas mulheres ihihi).

Nem tudo na vida são rosas, ou doces melodias... de vez em quando surgem ratinhos em que é preciso mexer...!


Nota: Apesar de a utilização de ratinhos na investigação de novos medicamentos ser incontornável, os ratinhos de laboratório têm todo um conjunto de legislação para os proteger e tudo é feito de forma que não lhes sejam causado nenhum sofrimento. Gostei de saber e ver isso com os meus olhos, pelo menos onde estive.

quarta-feira, 26 de março de 2008

10 segundos e 2 frases

Ontem aconteceu um daqueles momentos em que 10 segundos e duas frases transformam o resto do nosso dia. Adoro quando isso acontece.
Uma amiga teve a ideia, assim do nada, de irmos assistir ao recital da mezzo Angelika Kirchschlager... e um dia potencialmente igual aos outros ganhou um brilhozinho especial.

A senhora tem realmente uma voz bonita e é muito expressiva! E mexe-se imenso!...nunca mais me preocupo quando me disserem que me mexi demais durante uma música! Esta senhora dava passos para a frente, para o lado, para trás...inclinava-se para a frente, levantava um ombro, punha-se em bicos dos pés! Mas gostei, mesmo muito...especialmente do último lied de Liszt e da maioria dos lieder de Brahms.

Tecidos os comentários à senhora Angelika não posso deixar de dizer que o senhor Malcolm Martineau me agradou muitíssimo. As notas que saíam do piano esvoaçavam até nós, dançando em redor...e os pianíssimos soavam, como breves afagos, e deixavam-nos a pairar, entre as nuvens, até não mais conseguirmos distingui-los e regressarmos, encantados, ao chão.

E mais tenho a acrescentar que:

1. Adorei os caracóis dourados da senhora que pareciam ter vida própria;

2. No final, senti uma vontade quase irreprimível de ir até junto do piano e experimentar a acústica da sala...parece ser fantástica. Até lá estava o meu prof. acompanhador...por isso, se não lá estivessem aqueles senhores tão aborrecidos que certamente me tirariam de lá em 4 segundos com comentários de "ó menina, deixe lá de se armar em diva", já me estava a ver, e a ouvir, após os primeiros e enérgicos compassos de uma das canções ciganas de Dvořák...
Má píseň zas mi láskou zní když starý den umírá, a chudý mech kdy na šat svůjsi tajně perle sbírá..!

Concluindo gostei... muito!


Terça, 25 Mar 2008, 19:00 - Grande Auditório

ANGELIKA KIRCHSCHLAGER (meio-soprano)
MALCOLM MARTINEAU (piano)













Johannes Brahms

He, Zigeuner, greife in die Saiten ein, op.103 nº 1
Hochgetürmte Rimaflut, op.103 nº 2
Wißt ihr, wann mein Kindchen am allerschönsten ist? , op.103 nº 3
Lieber Gott, du weißt, wie oft bereut ich hab, op.103 nº 4
Brauner Bursche führt zum Tanze, op.103 nº 5
Röslein dreie in der Reihe blüh'n so rot, op.103 nº 6
Kommt dir manchmal in den Sinn, op.103 nº 7
Rote Abendwolken zieh'n am Firmament, op.103 nº 11

Felix Mendelssohn-Bartholdy
Es weiß und rät es doch keiner, op.99 nº 6
Das Waldschloss
Pagenlied (Wenn die Sonne lieblich schiene)
Nachtlied, op.71 nº 6
Wanderlied, op.57 nº 6

Franz Liszt

Im Rhein, im schönen Strome, S.272
Es rauschen die Winde, S.294
Es war ein König in Thule, S.278
Ein Fichtenbaum steht einsam, S.309
Die stille Wasserrose, S.321
O lieb, so lang du lieben kannst, S.298

Antonín Dvorák
Liebeslieder, op.83
Lasst mich allein, op.82 nº 1


«Parece-se com Nikole Kidman, move-se como Sarah Vaughan e canta com amor e prazer» – palavras que o Independent consagrava a Angelika Kirschklager em 2003 e que se mantêm actuais, dadas as continuadas e cada vez mais aplaudidas actuações deste meio-soprano nos mais prestigiados palcos do mundo. Actuações em que surge invariavelmente ladeada por alguns dos maiores intérpretes musicais do nosso tempo.


Para mais...
http://www.musica.gulbenkian.pt/cgi-bin/wnp_db_dynamic_record.pl?dn=db_musica_season_2007_2008_pt&sn=canto&orn=84


Si bemol...


O Si bemol entra em cena, discreto, sem pretensões. Nem Si natural consegue ser...não chega a tanto. Não inveja os Sobreagudos. Sabe do que é capaz... Lentamente vai pisando o palco, sentindo se é seguro avançar...no centro, o piano de cauda, preto e reluzente, exerce sobre ele uma atracção impossível de controlar. Aproxima-se, deslizando, do centro daquele mundo de sentidos e afaga a superfície espelhada e as teclas alinhadas. No momento em que se tocam, a voz e o piano fundem-se, o veludo e o metal entrelaçam-se, num arrebatamento de paixão, voam, cada vez mais alto, cintilam no ar, e deixam-se flutuar... pairar de forma etérea, sonhar...até que o enlevo se desfaz e nada mais poderá ser como antes...
O Si bemol apaixona-se.